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Maria acordava já a manhã ia bem longe, tomava o pequeno almoço, praticava a higiente matinal, punha a farda de trabalho que lhe assentava que nem uma luva e saia para o trabalho. Era assim todos os dias, ou pelo menos quase todos.
Não havia melhor do que Maria no seu ramo, nenhuma alma tinha tanta versatilidade ou colocava tanto emprenho para que o produto final sai-se o mais perfeito possível, e Maria era, durante a semana, alvo de cobiça e olhares invejosos.
Ao Domingo de manhã, Maria tinha uma outra rotina. Acordava cedo, bem cedo, vestia o vestido creme, estilo conservador anos 50 e abalava para a igreja. Não se pode ser totalmente perfeita, todas têm os seus pecados e Maria sabia-o como ninguém. Sentada no fundo, Maria contemplava o desprezo. O Manuel do talho roçou os olhos nela durante o Pai Nosso, encostando-os rapidamente ao chão. Afinal, os prazeres da carne são um pecado mortal, ou devem ser, de acordo com o homem de batina, padre a tempo inteiro ao fim de semana, pecador às terças entre as 11 e a 1 da manhã.
Durante meia hora, uma comunidade inteira fingia elevar o seu coração aos céus, em busca da purificação e beatificação, quando na verdade, na crua verdade, metade tinha o sangue a fervilhar de ódio e desprezo, enquanto a outra metade orava a um Deus dos prazeres da carne.
A tudo isto Maria achava piada. Maria tinha um sentido de humor estranho a que apensa metade da comunidade achava piada, à excepção do domingo de manhã, pois claro.
A noite prolonga-se pela escuridão dentro embrulhada num silêncio sem fim
e ao longe ecoa os gritos do teu nome.
Faz frio.
A lua intermitente por entre as nuvens outrora brancas clama o teu nome
e os bichos taciturnos percorrem em busca do teu sabor
e a noite prolonga-se sem fim pela escuridão.
Nas colinas erguem-se castelos
e nos vales as flores cobrem-se de neblina e orvalho,
lagrimas da tua ausência.
Faz sede.
E o riacho ao longe não corre
e os peixes hibernam sem sentidos
e a noite cobre-se de escuridão.
Há estilhaços do beijo que não deste espalhados pelo jardim,
e onde as flores não crescem e o sorriso ímpio das formigas prevalece
pedaços do que não houve de ti não esmorece, cresce pela madrugada fora.
Nas sombras da laranjeira o herege compactua.
É manhã ou noite ou por do sol, pois a luz tolda os sentidos
e a tarde esmorece e estremece só de pensar em ti.
E, no entanto, nesses estilhaços de ti espalhados pelo jardim
há uma refracção impossível de explicar.
Um brilho indómito, um arco-íris permanente e opulente.
Quero limpar o jardim, preciso de o fazer,
mas contigo a meu lado.
Quero em ti encerrar os meus sonhos
enterrar os meus suspiros
e soterrar a minha vida.
Se ao menos fosse tudo tão fácil
quanto escrever uns miseros versos.
Conheci um gajo que tinha a líbido no anús,
sempre que amava só fazia merda.
Conheci outro que a tinha na ponta dos dedos dos pés,
ao amar, espalhava-se ao comprido.
É muito curiosa essa líbido,
serve de desculpa para tanta estupidez.
Há uma teatrilidade exacerbada nos dias dos amantes
as mãos geometricamente dispostas sob as leis da física
a actração magnética dos olhares
a polaridade exacerbada dos lábios.
E, no entanto, os métodos quânticos são incapazes de descrever os pequenos detalhes,
sim, porque o amor esconde-se nos detalhes mais infimos da quantica amorosa.
Ai a ciência não chegou por ora.
Há poemas exploratórios, tratados psicológicos e fisiológicos
opiniões de Freud e peças de shakespeare
seratonina produzida artificialmente
mas nenhum CERN para o amor.
E deveria haver um grande CERN para os amantes,
que procura-se a sua essência até à mais pequena partícula, qual bosão de higgs.
Porque se o bosão de higgs de é a particula de Deus e Deus inventou o amor
deve haver um rasto da sua fabricação,
e deve ser possível sintetizar e replicar o amor que um dia alguém sentiu
e usar a analítica, a física e a química e a quântica,
desfragmentar em pequenas partículas e voltar a juntar tudo novamente.
Talvez seja idiotice minha, mas deveria haver um CERN para o amor.
Queria mergulhar nos teus braços e adormecer ao som estridente da noite
percorrer os vales do teu corpo de norte a sul e terminar com os corpos alinhados
numa simbiotica disposição.
Não te quero pelo que tens, mas pelo que és
pelo que me fazes ser
e sentir.
Não anseio a volubilidade da posse, mas a incerteza da simbiose,
a atracção química das marés. Agora rebentanto aos meus pés
mais distante num futuro breve
mas sempre retornando ao mesmo delirio constante.
Num mundo onde as palavras vão perdendo os sentidos
e as forças das físicas prevalecem sobre tudo o resto
procuro um porto de abrigo
onde o sonho possa atracar .
Todas as frases deveriam terminar num ponto final
Mesmo as que terminam em exclamação.
Quando me deste as reticências com sabor a vírgula fiquei à espera,
e esperei, e esperei. Julguei que fosse continuar a história,
repleta de pontos de interrogação e exclamações,
mas o desenrolar não veio, surgiu antes a angustia
velha madrasta do desespero.
Quando dei por conta, não eram reticências, mas sim três pontos finais.
Um para o fim do que fomos contruindo, outro para o fim do que estavamos a viver, outro para o terminar do sonho.
No fundo, à excepção do ponto final, todos os restantes sinais de pontuação são vagos e inócuos
de interpretações diversas.
Tinhas usado um só ponto final e eu teria já tido usado o ponto de exclamação a triplicar múltiplas vezes.
Há vidas suspensas em gargalos vazios
e familias pairando numa dança de éter.
Ele ama-a, não há dúvida
ele ama-a.
Um amor com aroma a frutos silvestres e travo de ervas frescas
consumido gentilmente fresco.
Um amor que penetra a pele, que suspira
tatuado a timbre lívido para a eternidade.
E no fim, por vezes, a morte separa para todo o sempre.
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